A apresentação do preso em flagrante delito ao juízo no prazo de vinte e quatro horas contado da assinatura da Nota de Culpa consiste em síntese na denominada audiência de custódia.
Em suma, seu objetivo é de verificar a legalidade e o cabimento da prisão pelo Magistrado de forma célere, bem como se houve abuso por parte das autoridades policiais.
É de se destacar também que este é o primeiro contato pessoal do acusado com o Juiz, que outrora ocorria na audiência de instrução e julgamento, como por certo ainda ocorre nas comarcas onde não estão implementadas as audiências de custódias, ou seja, de forma bastante tardia.
Ocorre que no Brasil a primeira legislação acerca do tema veio com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, especificamente em seu artigo 7º, 5:
“Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.”
Embora o Pacto de São José da Costa Rica trouxe o texto legal acerca do tema, este não regulou a audiência de custódia para a prática no dia a dia forense nacional, ao passo que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) veio a editar a Resolução nº 213/2015 regulamentando efetivamente sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas.
Assim, tendo a audiência de custódia sido efetivada no ordenamento jurídico brasileiro, sobreveio a grande problemática de se colocar em prática.
Neste viés o Supremo Tribunal Federal julgou por maioria a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347 (ADPF 347) determinando aos tribunais de todo o país para que dentro de 90 (noventa) dias contados do dia 1º de fevereiro de 2016 implantem em todo o território nacional a audiência de custódia.
Em que pese a determinação da Suprema Corte do país, a realidade em que vivemos é bastante diferente. O Estado de Mato Grosso é um exemplo desse descumprimento, uma vez que somente a capital Cuiabá vem realizando as audiências de custódia, de maneira que todas as cidades do interior sequer possuem previsão para a sua implementação.
Nessa esteira, mesmo havendo alegações de falta de estrutura e contingente policial para deslocar os presos no prazo legal, entende-se que se poderia buscar alternativas, ainda que temporárias, para a realização dessa audiência em todo o território canarinho.
Ainda que haja decisões em sentido contrário, uma solução temporária seria a implantação da audiência de custódia por videoconferência, o que por óbvio atingiria parte dos objetivos da audiência, posto que mesmo que o preso não tenha contato pessoal com o Juiz, este poderia ouvi-lo e ter maior convicção sobre a legalidade e cabimento da prisão, alcançando o objetivo da comunicação inicial, ainda que por meio eletrônico, entre o Magistrado e o detido.
Desta forma conseguiria o Magistrado ter melhor convicção e, consequentemente, tomar decisão mais acertada a respeito do relaxamento da prisão, concessão da liberdade provisória ou ainda a conversão em prisão preventiva.
Fazendo um compêndio, o que deve ser refutada é a ideia do descumprimento das determinações legais e judiciais (Resolução nº 213/2015 e ADPF 347), sendo totalmente descabível que o Juiz decida sobre a prisão em flagrante do detido através de papéis e documentos, como vem ocorrendo nas comarcas onde não há a implantação das audiências de custódia.
Isso posto, diante da flagrante ilegalidade que vem ocorrendo nessas comarcas, restam aos advogados arguirem como tese a nulidade da prisão em face do descumprimento da determinação legal e judicial.
Augusto Bouret Orro é advogado.