O Supremo Tribunal do Quênia declarou nesta sexta-feira (1º) que a reeleição do presidente Uhuru Kenyatta foi inválida devido a irregularidades cometidas pelo conselho eleitoral e ordenou a realização de um novo pleito em 60 dias, segundo a Reuters.
“A declaração [da vitória de Kenyatta] é inválida, nula e sem efeito”, disse o juiz David Maranga, anunciando o veredito apoiado por quatro dos seis juízes. Esta é a primeira vez na África que um Supremo Tribunal anula o resultado de uma eleição presidencial, de acordo com a oposição queniana.
“As eleições presidenciais não aconteceram de acordo com a Constituição” e o resultado é “inválido e nulo”, completou, antes de ordenar que a Comissão Eleitoral (IEBC) organize uma nova votação em dois meses, como determina a Carta Magna.
Candidato Raila Odinga (no centro) acompanha julgamento sobre eleição presidencial no Quênia nesta sexta-feira (1º) (Foto: Sayyid Abdul Azim/ AP)
Do lado de fora do Tribunal Supremo, que tinha um grande esquema de segurança nesta sexta-feira, os simpatizantes da oposição comemoraram o anúncio. No bairro de favelas de Kibera, em Nairóbi, um dos principais redutos da oposição, milhares de seguidores de Odinga exibiam cartazes com dizeres como “pela primeira vez vimos justiça no Quênia”, segundo a Efe.
Kenyatta acatou a decisão e fez um apelo para que seus partidários respeitem a lei mesmo se estiverem em desacordo com a decisão da suprema corte, de acordo com a Reuters.
‘Erros humanos’
Os advogados da oposição afirmaram que a eleição presidencial teve “tantas irregularidades que pouco importa saber quem ganhou ou quem foi declarado vencedor”, segundo a France Presse.
Presidente do Quênia, Uhuru Kenyatta, vota ao lado da sua mulher, Margaret, no norte de Nairobi, nesta terça-feira (8) (Foto: Ben Curtis/ AP)
Eles destacaram que o processo de recebimento e de verificação dos resultados tinham erros e incoerências “deliberados e calculados” para aumentar o número de votos de Kenyatta em detrimento de Odinga.
A Comissão Eleitoral (IEBC) reconheceu que detectou alguns “erros humanos cometidos” que teriam passado “despercebidos”. Mas afirma que eles foram corrigidos e eram muito periféricos para influenciar o resultado final. A Comissão havia solicitado ao Tribunal Supremo a não questionar a soberania do povo.
Os advogados de Kenyatta defenderam que a grande diferença de votos entre o presidente e seu rival (mais de 1,4 milhão de votos) e os bons resultados obtidos pelo partido governista, Jubilee, nas eleições para governadores, senadores e deputados, no mesmo dia, não davam margem para dúvidas sobre a vitória.
Polícia dispersa manifestantes em Mathare, em Nairobi, no Quênia, após declaração de vitória de Kenyatta (Foto: Thomas Mukoya/ Reuters)
Votação em agosto
Na votação de 8 de agosto, Kenyatta teve 54,3 % dos votos, à frente do rival Raila Odinga, que teve 44,7 %, de acordo com números divulgados pelo chefe da comissão eleitoral, Wafula Chebukati, três dias após a eleição. Quase 80 % dos 19 milhões de eleitores registrados votaram.
A coalizão opositora Super Aliança Nacional (NASA, na sigla em inglês) denunciou fraude nas eleições e, após o anúncio da reeleição de Kenyatta, o país teve dois dias de violência. Ao menos 21 pessoas morreram nas manifestações e distúrbios, reprimidos pela polícia.
Os choques lembraram os confrontos pós-eleitorais de 2007-2008, que deixaram mais de 1.100 mortos, mas este ano ficaram limitados aos redutos oposição, nos subúrbios de Nairóbi e no oeste do país.
Confronto entre dinastias
O cancelamento da votação, decisão inédita na história do Quênia, dá início a uma nova fase da dura disputa entre as duas principais dinastias políticas do país da África Oriental. De um lado está Kenyatta, um rico empresário de 55 anos e filho do presidente fundador do Quênia. De outro está Raila Odinga, um ex-prisioneiro político de 72 anos e filho do primeiro vice-presidente do Quênia.