Conta-se, e a “história” nunca foi desmentida, que o Gen. Charles De Gaulle, herói francês da Segunda Guerra Mundial, visitou o Brasil – na época da Ditadura, para rever seu amigo e antigo aluno Mal. Castelo Branco (que havia feito Escola Superior Militar na França).
Dois constrangimentos passou o herói francês: o primeiro, na cama do Hotel Nacional, em Brasília, não cabia o corpo do hóspede, que tinha cerca de 2,20 metros de altura e a cama pouco mais de 01 metro e oitenta; ou seja, cobertor curto.
O outro constrangimento ocorreu num almoço com o alto comando militar no Forte Apache, como é conhecimento em Brasília, o local onde se concentra a maior parte dos militares altamente graduados. Nesse almoço, o Gen. De Gaulle perguntou a Castelo Branco quantos Marechais tinha o Brasil.
Ao saber da resposta (mais de 30 e cerca de 80 generais, todos na ativa), deu a informação de que na França eram 03 Marechais na ativa em tempos de paz, e em casos de crise internacional ou possibilidade de guerra externa, seriam 05 oficiais dessa patente. E, disse Charles De Gaulle, a famosa frase: “O Brasil não é um país sério”.
Profecia, aliás, não desmentida e que vem se cumprindo neste país do carnaval e do futebol.
Recentemente, dois episódios recentes cumpriram cabalmente a profecia: um, a absolvição da Chapa Dilma/Temer pelo TSE por “excesso de provas”; e o outro, a negativa da Câmara Federal em autorizar a abertura de inquérito no STF contra o presidente Temer, apesar da famosa e filmada “mala” dos 500 e outro caminhão de provas.
Mas, outro fato também mostra a veracidade da visão de De Gaulle sobre o Brasil: a inusitada visita da nova Procuradora Geral da República – dra. Raquel Dodge ao presidente Temer, às 22h, e sem constar da agenda oficial, como é costume de Temer.
Não se sabe se a visita ocorreu no famoso “porão” do Palácio do Jaburu, como outra recente visita que todos sabemos.
Depois de concordar com a ideia do presidente Temer de ser empossada como procuradora-geral da República em cerimônia no Palácio do Planalto (outro fato inusitado), Raquel Dodge voltou atrás, cinco dias após, e anunciou constrangida que sua posse será no auditório da PGR, no dia 18 de setembro.
A visita ocorreu no mesmo dia em que Temer pedira ao STF a suspeição do atual Procurador Geral Rodrigo Janot, seu inimigo confesso.
Será que ele sabia desse convescote? Depois do encontro com Dodge, assessores do presidente Temer informaram que a cerimônia de posse no Palácio do Planalto seria um gesto simbólico de “reaproximação” do Executivo com o Ministério Público.
O que significa essa “reaproximação”? Estancar a “sangria” da Lava Jato? Cuidar com mais “carinho” das denúncias envolvendo os figurões da República – inclusive Temer, que não param de acontecer, quase todo dia? Ou, engaveta-las, simplesmente?
A PGR não tem autonomia funcional, precisando de “proximidade” com o Planalto? A ida de Raquel Dodge ao Jaburu, tarde da noite, fez com que muitos se lembrassem dos tristes tempos de Geraldo Brindeiro, o Procurador Geral nacionalmente conhecido como “Engavetador Geral” no Governo FHC.
Será que teremos agora uma versão feminina de uma “Engavetadora Geral”? Não seria o caso de se alertar a futura Procuradora-Geral de que o interlocutor noturno dela é uma autoridade denunciada criminalmente?
O fato de a Câmara não ter autorizado o prosseguimento da denúncia não faz desaparecer a acusação. Ela está somente suspensa, pois no dia 1º de janeiro de 2019 os prazos voltam a correr.
E, como é óbvio, não é muito salutar, nem parece juridicamente recomendável, a denunciante/PGR ficar se encontrando às “ocultas” com um denunciado e potencial réu.
Onde fica a sua isenção, já que ela vai atuar no futuro processo no STF caso, por milagre ou cumprimento de profecia, chegue até lá?
No outro dia, a procuradora se encontrou com outro enigmático personagem: o ministro Gilmar Mendes do STF, parece que também, “extra agenda”; para, segundo ela, discutir sobre “crimes eleitorais”.
Já está agindo antes da posse, como procuradora? Ou esse novo encontro foi um prosseguimento do anterior, pois, Gilmar Mendes havia jantado com Temer no mesmo dia do encontro da Procuradora?
Coincidências que lançam, talvez injustamente, uma névoa sombria na comunidade jurídica nacional, em todos os seus segmentos, sobre a atuação futura da Procuradora Geral.
De todo modo, os dois encontros pegaram muito mal para a futura Procuradora Geral da República, vez que Temer e aliados mantém uma guerra incessante ao atual ocupante do cargo e, como tem dito diariamente, que com a sua saída, as coisas vão “melhorar” no relacionamento entre o Executivo, Legislativo e PGR; ou seja, esperam a tal “reaproximação”; pois Raquel Dodge é a “anti-Janot”.
Falta um encontro dela, também sem agenda, e “no escurinho do cinema”, com Sarney, Lula, Renan, Jucá e outros medalhões, para se “canonizar” De Gaulle.
Na Bíblia, um teste do profeta, para sua legitimação, é o cumprimento da sua profecia. De Gaulle, pelo visto, já merece, ao menos, a beatificação política.
“O povo do Brasil tem a concepção de que os poderosos são governados pelas suas próprias vontades, daí talvez a tendência deles em ter em pouca conta as disposições de lei.” (Lima Barreto).
É esperar prá ver.
AUREMÁCIO CARVALHO é advogado em Cuiabá.
auremacio.carvalho@hotmail.com