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Por que Merkel deverá vencer

G1

Durante a crise dos refugiados, em 2015, um novo verbo se espalhou pela Alemanha: “zu merkeln”. O significado: empurrar decisões com a barriga, sem fazer muito enquanto os problemas se acumulam. Apesar de tudo, a chanceler Angela Merkel, se encaminha para mais uma vitória nas eleições alemãs do próximo domingo.

Se completar o mandato, a ex-química da Alemanha Oriental, no poder desde 2005, se tornará o governante alemão mais longevo no Pós-Guerra, superando seu mentor, Helmut Kohl. Numa pesquisa recente em 37 países, do Pew Research Center, ela foi o único líder mundial a despertar mais confiança que desconfiança na população.

Avessa a discursos ou palavras de efeito, sem muito carisma nem paciência para distribuir cumprimentos ou pegar crianças no colo – uma exceção notável foi quando consolou uma menina na TV em 2015 –, seu governo tem atraído eleitores de vários matizes ideológicos e partidos além do seu (CDU/CSU).

Jovens e ambientalistas apoiam sua política aberta em relação aos refugiados. Esquerdistas aplaudem a manutenção da rede de proteção social e do salário mínimo. Liberais se beneficiam da estabilidade econômica e do conservadorismo fiscal.

Seu estilo, num resumo feliz da revista The Economist, se desdobra em três características. “Ela é ética, não ideológica; reativa, não programática; desapegada, não engajada”. Ao enfrentar problemas, mistura a compaixão pelos pobres de suas raízes luteranas ao pragmatismo de sua formação científica.

Um exemplo foi a atitude diante de mais de 1 milhão de refugiados sírios em 2015. Primeiro, recebeu-os de braços abertos, desafiando as críticas daqueles que não viam como a Alemanha poderia abrigar tanta gente. Em seguida, pôs em marcha um plano minucioso de realocação pelas as cidades, de acordo com população e capacidade. Finalmente, negociou um acordo com a Turquia para repatriar os desalojados, em troca de dinheiro. Em suas próprias palavras, “não pode haver outro ano como 2015”.

A crise aguda passou, mas cobra seu preço na urna. O influxo de refugiados alimentou o discurso nacional-populista e ampliou o eleitorado do partido Alternativa para a Alemanha (AfD). Pesquisas sugerem que ele sairá do domingo como terceira força eleitoral, atrás da CSU/CSU e do rival SPD, que repete a trajetória de decadência da social-democracia na Europa.

Ao contrário da França e do Reino Unido, onde o sistema de eleição distrital reduz a representatividade dos partidos extremistas, como a Frente Nacional de Marine Le Pen, a Alemanha adota o voto distrital misto, que tanta gente quer implementar no Brasil.

O eleitor vota duas vezes, num nome e num partido. Por meio da votação nominal, um representante é selecionado para cada um dos 299 distritos. Em seguida, são acrescentados assentos até que a composição do Bundestag (Parlamento) reproduza fielmente a proporção de votos nas urnas – hoje há 631 deputados, mas pode haver menos ou mais.

O histórico do nazismo e a cultura da memória sempre limitaram a representação da extrema-direita na Alemanha. É também difícil romper a barreira de 5% dos votos exigida para que um partido consiga cadeiras no Bundestag (mesmo que obtenha representantes distritais).

O crescimento do AfD, com seu discurso anti-imigração e anti-União Europeia, põe hoje a votação do partido em torno de 10%. Por beneficiar-se também do voto duplo, tal patamar poderá ser ainda maior, sobretudo nas regiões da antiga Alemanha Oriental.

Prova do sucesso da AfD é influência em outros partidos. Liberais e a própria CDU ajustaram seu discurso para não perder eleitores. Uma vez no Bundestag, o debate sobre imigração e integração europeia deverá ser colocado noutros termos.

O principal motor do avanço do populismo na Europa foi a crise econômica, como demonstra um estudo da Brookings Institution. Com base na análise de votações recentes, como o Brexit no Reino Unido, os pesquisadores verificaram que partidos populistas têm mais sucesso nas regiões de maior desemprego, em especial naquelas que receberam imigrantes como mão-de-obra na construção civil.

A vitória de Merkel poderá ser atribuída à forma como ela soube enfrentar os desafios derivados da crise econômica. A Alemanha registra o maior crescimento entre países ricos (1,9% em 2016) e o desemprego mais baixo desde 1980 (3,6%). No momento mais crítico para a Zona do Euro, foi dura com a Grécia na mesa de negociação e cedeu o mínimo necessário para evitar o colapso da moeda.

Com a paranoia e ambiguidade características de quem foi criada do lado de lá do muro de Berlim, Merkel tem apoiado a ideia do presidente francês, Emmanuel Macron, de criar um ministério das Finanças europeu, com algum tipo de união fiscal. Mas é vaga sobre os poderes do cargo ou sobre como implementá-la. Só agirá, provavelmente, quando for inevitável, depois de muito “zu merkeln”.


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