"> A máquina de costura Singer – CanalMT

A máquina de costura Singer

A minha mãe era de poucas letras. O que lhe faltava de ensino regular lhe sobrava em sabedoria que ela aprendeu observando, vivendo e conversando.

Ela era uma exímia conversadeira e tinha uma memória formidável.

Tudo que aprendeu foi via oral. Uma de suas tantas habilidades era costurar.

Aprendeu sozinha, desmontando roupas que serviam de moldes para outras que criava.

Fez para a família calças, camisas, blusas e vestidos de uma variedade imensa. Ela era inventiva. Via uma peça e fazia outra igual ou parecida.

Tinha uma formidável máquina de costura Singer que tantos e incontáveis serviços prestou para a família, amigos e vizinhas! Essa máquina de costura trabalhou anos a fio sem nunca receber manutenção.

Esse monumento ao trabalho encontra-se na casa de minha irmã e nunca mais foi utilizada. Descanso merecido.

No internato, eu fiz um curso de corte e costura. Com vê: sou pau para toda obra! O que ficou deste curso foi que aprendi a pregar botões e a coser algumas peças descosturadas.

Acho que foi por isto que a minha mãe me deu um exemplar da máquina Singer que hoje orna o pequeno escritório que mantenho em casa.

As pessoas tinham o prazer de ensinar tudo que sabia para os filhos. Se ganha segurança com o trabalho e os seus resultados.

Os meninos normalmente eram iniciados nas atividades do pai. E as meninas aprendiam a coser, fazer tricô e cozinhar.

Hoje, com a industrialização e automação, os filhos aprendem tudo nas telas de computadores, smartfones e celulares, o que os leva achar que sabem tudo e nada têm a aprender com os mais velhos.

Estes viraram uma máquina Singer abandonada num canto qualquer.

Atualmente, tudo está pronto ou semipronto e é descartável. Estragou joga fora e compra outro. E esta prática se estendeu a amizades, parcerias e amores.

As relações são descompromissadas. Sai de uma e entra em outra. Não se namora, fica. Não se casa se junta.

Os amigos são parceiros de ocasião. Não se tem mais paciência para cultivar, preservar e manter. E a vida segue sem empenho, sem lodo e sem raízes.

Ficou a imagem indelével da minha mãe a coser na sua infalível máquina Singer, movida com os pés, de onde ela ordenava e vestia de toda a família.

Esta imagem é símbolo da atenção, do empenho, do carinho e do apreço de quem tinha objetivos e sabia exatamente o que fazer com os destinos da família.

E nós! Pobres de nós! Perdemos as certezas, nas incertezas da vida contemporânea de tantas informações.

Não sabemos lidar direito com filhos, amigos, amores, colegas, parceiros e com este Brasil de futuro incerto.

RENATO GOMES NERY é advogado em Cuiabá, foi presidente da OAB-MT.

rgnery@terra.com.br


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