Em artigo do início de 1989, avaliei o ano de 1988 como “talvez o mais positivo da história recente” de Cuiabá, tendo por base o deslanche de alguns macroprojetos fundamentais para o desenvolvimento da cidade e do Estado.
Enfim, tinha sido iniciada a construção da APM de Manso, a Sudam havia aprovado o projeto da ligação de Cuiabá ao sistema ferroviário nacional e havia sido proposta com grande otimismo e alarde a saída rodoviária para o Pacífico, via San Mathias.
Passados trinta anos e iniciando a quarta década pós 88, valeria fazer uma avaliação do que de fato aconteceu com estes projetos e a quantas andaram as expectativas tão positivas. Talvez sirva para alguma coisa.
Idealizada com a cheia de 1974, visando à proteção da Grande Cuiabá contra novas enchentes, a barragem de Manso teve seu projeto ampliado em fins dos anos 70 para uma barragem multifinalitária destinada à geração de energia, ao abastecimento de água de Cuiabá e Várzea Grande, à irrigação de 50 mil hectares na Baixada Cuiabana, e ao desenvolvimento de projetos nas áreas de turismo e aquicultura.
A obra foi de fato iniciada em 88, mas paralisada em 89 e só retomada em 1998 com grandes prejuízos, dentre os quais a perda do canteiro de obras, inclusive com maquinário pesado.
Inaugurada em fins do ano 2000, cumpre hoje seu principal objetivo, assegurando níveis mínimos de água e evitando picos de vazões superiores à de 74, como em 15 de janeiro de 2002.
Empurrado só por seu próprio potencial, Manso está avançando com grandes projetos de piscicultura, a instalação de condomínios de lazer, pousadas de alta sofisticação, e já vive a expectativa da legalização dos jogos com seu grande potencial turístico.
Poderia ter avançado muito mais, inclusive no abastecimento de água e irrigação, até hoje sequer prospectados em termos de viabilidade.
A ferrovia também vem avançando, considerando que em 88 seus trilhos estavam nas barrancas do Paraná, em São Paulo. Hoje está em Rondonópolis, onde foi instalado o maior terminal ferroviário da América Latina.
Em 1989, teve sua concessão outorgada à Ferronorte, concessão que foi repassada diversas vezes, sem ainda cumprir seu primeiro objetivo, que era chegar a Cuiabá, depois prosseguir em direção aos portos amazônicos e do Pacífico, levando e trazendo o desenvolvimento para todo Mato Grosso.
Inexplicavelmente, em 2010, a então concessionária devolveu a concessão a partir de Rondonópolis.
Por coincidência ou não, ao mesmo tempo, surgia o projeto da Fico, com 1200 km levando a produção de Mato Grosso para Goiás. Depois, surgiu outro ligando o Leste do Estado ao Porto de Espadarte, no Pará, ainda em construção.
E a ferrovia em Mato Grosso virou então ferramenta de geopolítica em vez de logística, envolvendo exageradas ambições regionais e políticas.
Encerrando 2017, a óbvia ligação Rondonópolis-Cuiabá–Nova Mutum, de apenas 460 km, voltou a ser prioridade para o Estado, BNDES, Nova Mutum e a própria atual concessionária (Rumo), resgatando o bom senso nesse assunto fundamental e tão urgente para o Estado. Enquanto demora, produção, meio ambiente e vidas são perdidas.
A saída rodoviária para o Pacífico encontrou forte alento no primeiro Governo Maggi, com o governador liderando uma caravana até o Chile.
Mas ficou por aí. Hoje, as ligações do Brasil ao Pacífico saíram por Mato Grosso do Sul e Acre. Por aqui, nem pela linha aérea entre Cuiabá e Santa Cruz, outrora existente.
Agora, em dezembro de 2017, uma nova esperança pois autoridades bolivianas disseram em Cuiabá estar negociando com o Banco Mundial a pavimentação entre San Matias e San Inácio. Querem exportar ureia e gás de cozinha para Mato Grosso.
Aí, finalmente, Mato Grosso estaria ligado diretamente ao Pacífico. Será?
JOSÉ ANTONIO LEMOS, arquiteto e urbanista, é membro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso (CAU/MT) e professor universitário em Cuiabá. joseantoniols2@gmail.com