O governo Bolsonaro não precisa de oposição, mesmo porque, murcha, acabrunhada, calada, sentindo o peso de sua insignificância diante da última eleição, os partidos de “esquerda” pouco ou mesmo nada podem propor, pois se tornaram numa minoria incapaz de seduzir a população ou o Congresso para suas plataformas. Mas, nem por isso o governo tem uma vida fácil, pois começando dos seus filhos, e passando por inúmeros ministros e aliados, o governo tem todo dia sua vida vasculhada devido a atitudes suspeitas.
Afora os enroscos do filho-senador Flávio Bolsonaro com o Coaf, o presidente comanda um ministério contaminado. Inclui um condenado por improbidade administrativa (Ricardo Salles), um denunciado por fraude em licitação e tráfico de influência (Luiz Henrique Mandetta), um investigado por transações suspeitas com fundos de pensão (Paulo Guedes), uma citada em delação da JBS (Tereza Cristina), um beneficiário confesso de caixa dois (Onyx Lorenzoni) e outro suspeito de envolvimento no caso dos candidatos laranjas do PSL (Marcelo Álvaro Antônio), sem esquecer o atual presidente do PSL, Luciano Bivar, que direcionou os recursos para as candidaturas laranjas do seu Estado, além do infeliz do Gustavo Bebianno, corresponsável pela laranjada ao distribuir as verbas eleitorais pelo país, e que atualmente está sendo fritado.
As falcatruas dos aliados e as barbeiragens da família levam para dentro do Palácio do Planalto as suspeitas sobre o esquema de candidaturas de fachada, as atitudes suspeitas dos seus membros eminentes, além de mostrar mais uma vez a inabilidade do governo em construir barreiras para a contenção de crises. Acuado, Bolsonaro decidiu jogar na fogueira o ministro Gustavo Bebianno, que comandou o PSL durante a campanha eleitoral. Em uma publicação nas redes sociais, Carlos Bolsonaro acusou Bebianno de mentir sobre diálogos que Bebianno disse ter realizado com o presidente. Reproduziu ainda uma gravação em que Bolsonaro dizia ao ministro que não trataria do assunto. No fim do dia, o presidente repetiu essa informação na sua rede também. Ou seja, a busca sumária de um culpado próximo ao evento, para afastar do governo a culpa coletiva, algo antigo e pouco eficiente para sanar o mal existente.
Naturalmente, uma eventual saída de Bebianno será insuficiente para estancar a crise, pois que devido aos ministros despreparados que tem ao seu redor, cada um querendo aparecer mais do que o outro, ou algum fala bobagem, ou algum é acusado, o que depõe contra Bolsonaro. Todos estão mais acostumados aos debates nas redes sociais, do que a prosaica busca do certo e do justo, e combatem agora velhos fantasmas, mas desconhecem a complexidade das ações humanas. O fato é que suas promessas de honestidade estão parecendo bem desonestas, mais uma farsa eleitoral. E se por enquanto ainda não decai a popularidade do governo, isto não é garantido que vai permanecer, pois dentro em breve pode parecer que já se passou muito tempo sem que nada de bom, ou útil, ou justo tenha ocorrido. Mesmo as questões econômicas tem que apresentar pelo menos esperança, mas a mesma se esvanece no decorrer de um breve tempo.
Para quem acreditava na honestidade do presidente e dos seus próximos, está cada vez mais difícil defender o atual governo, e calam-se sumariamente diante de tantas evidências. É claro, sempre há ainda muitos a defender Bolsonaro, assim como há muitos a defender Lula, mas o ímpeto e o volume de defesa diminuem de ambos. O fato é que Bolsonaro e seus pares estão acostumados a dar palpite sobre as coisas em mensagens breves e instantâneas, mais combatendo inimigos que criando argumentos razoáveis, mas agora não podem continuar a querer matar algo que já está morto, mas tem antes de criar uma política melhor, ou acordos sociais mais justos. Até o momento, não sabemos em que Bolsonaro é diferente dos demais governantes que já tivemos, apenas que ele fala diretamente com o seu público, mas se for essa a única novidade, em muito pouco tempo isso perderá a graça e cairá no tédio, pois queremos mais atitudes do que discurso raivoso dos governantes.
ROBERTO DE BARROS FREIRE é professor do Departamento de Filosofia da UFMT.