A minha infância foi bem vivida com muitas atividades e opção de saber usufruir as coisas simples que a cidade de Cuiabá nos oferecia nos anos 70.
Naquela época: recebíamos a educação que sempre foi obrigação da família (pai e mãe); buscávamos o saber (que sempre foi obrigação dos mestres) e como era bom viver entre os colegas cuiabanos nos pátios e nas salas de aulas da Escola Modelo Barão de Melgaço, e ao final das aulas a gurizada ainda encontrava tempo para brincar ou brigar nas praças( da República e Alencastro).
As brigas de rua dos alunos da Escola Modelos eram marcadas ainda dentro da escola, e cada um dizia – “se você for homem me espera lá fora” e quando terminavam as aulas, as desavenças eram acertadas nas Praças, e sempre tinha um mediador que determinava e comandava o “combate”, e o primeiro passo era que os dois tirassem as camisas brancas da Escola Modelo para não sujá-las e também para que ficassem como representação de duas bandeiras simbólicas de cada um dos dois estudantes.
E, para começar, o mediador dizia assim: esta camisa é a sua mãe e esta outra é a mãe do outro, e quem for mais homem chute a camisa do outro, e como mãe sempre foi à coisa mais sagrada do mundo, assim que houvesse o primeiro chute em uma das camisas, começava a briga, mais logo aparecia um “deixa disso” e a briga marcada acabava sem vencido ou sem vencedor, e no outro dia o relacionamento continuava, porque se a professora viesse a saber da briga, o castigo dela era sagrado, assim;
– ficar em pé durante o tempo da aula;
– ou escrever 100 vezes: “EU NUNCA MAIS VOU BRIGAR NA RUA”
– e, a pena máxima em alguns casos: SUSPENSÃO.
Nas folgas das aulas, e após as tarefas e a decoreba das tabuadas, vivíamos a chupar as frutas dos quintais cuiabanos, e durante as tardes, a gurizada passavam andando pelos bairros e um dos divertimentos principais era jogar bola nos campinhos de barros e pedregulhos de Cuiabá de antigamente, e eu, jogava nos campinhos: da Av. Coronel Escolástico e da Rua São Benedito, onde cada um tinha um sonho de um dia ser um Jogador de Futebol, e ao fim da tarde voltava para casa “machucado” e de contusões em contusões, recorria a minha querida benzedeira Dona Georgina, que morava ali na Av. Coronel Escolástico, e muitas vezes ao procurá-la além de ser “benzido”, recebia a simplicidade dos seus ensinamentos, sempre ficava com os meus pensamentos dialéticos, questionando: de onde vem esse poder de curar e de abençoar as pessoas que as procuram?
Aqueles que a procuravam, ao sair ficavam impressionados com a sua sabedoria popular e que não vinha de nenhum livro, mas com certeza, ficávamos com uma sensação de cura, e mais próximo da simplicidade da sua sabedoria e com isso, aumentava a fé em Deus.
Cuiabá da minha infância querida, das lindas lembranças, dos doces sabores das frutas dos quintais cuiabanos, e principalmente de andar livre em busca de amigos e das brincadeiras, e das faltas dos brinquedos, onde a bola rasgada era o que restava, e os campinhos de “peladas” era o que não faltava.
A criançada tinha a liberdade de desenvolver a sua personalidade e o seu caráter de forma espontânea, todos nós éramos livres para fazer amizades e a felicidade era encontrada em cada esquina desta cidade, em cada campinho de rua e as gozações eram resolvidas entre os próprios guris, não havia Billings, ou coitadinho, porque todos tinham pelo menos um apelido e nem por isso ficava revoltado, ou ficava tristinho. E, eu era “carinhosamente” chamado de Fuá, talvez pelas confusões que eu aprontava, ou talvez por ser o escolhido como primeiro no “par ou impar” pelas loucuras dos dribles que espontaneamente aplicava ou pelas brigas que eu arrumava pelas “bolas divididas”, e pelas lutas em busca das vitorias, pois nunca aprendi com as derrotas e nem por brincadeira aceitava perder, ali nos campinhos dos Bairros de Cuiabá, era onde que os moleques aprendiam a ser homem de verdade, era uma brincadeira que ensinava a ser um vencedor.
E, entre tantas confusões e brigas de rua, um dia chamei um adversário de “Mula Manca”, e esse cara era muito mais forte e maior que eu, e por isso, levei uma surra na rua e ao chegar em casa, levei outra surra da minha mãe, que fazia a educação familiar ao seu modo: “se brigar na rua, terá o corretivo em casa”.
Como era bom ser criança em Cuiabá, e viver a felicidade de ser livre e andar pelas ruas lindas e aproximando da cultura dos bairros, sabendo aproveitar cada um minuto da nossa infância, pois naquele tempo não havia violência de rua e nem a maldita droga, foi um tempo bom que não volta mais, a saudade é tão forte que até sentimos os cheiros das frutas dos quintais cuiabanos e as gritarias das gurizadas brincando nas ruas de Cuiabá.
Salve, salve nossa querida Cuiabá.
Econ. Wilson Carlos Soares Fuáh – É Especialista e Recursos Humanos e Relações Sociais e Políticas. Fale com o Autor: wilsonfua@gmail.com